Alta do IOF expõe racha na 'lua de mel' entre Alcolumbre e Lula
Eleito em fevereiro para presidir o Senado, Davi Alcolumbre começou o mandato como fiador de interesses do Planalto e até viajou para a China com Lula. Mas, d...

Eleito em fevereiro para presidir o Senado, Davi Alcolumbre começou o mandato como fiador de interesses do Planalto e até viajou para a China com Lula. Mas, diante de medida de alta de impostos, deu 'ultimato' ao governo. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), fez chegar ao Palácio do Planalto alertas da Casa presidida por ele. O descontentamento com decisões do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi um dos pontos da conversas entre ele e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na noite de quarta-feira (28). Alcolumbre revelou a Haddad que o clima na Casa azedou com o decreto de Lula para elevar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Pouco antes, no entanto, ele próprio havia dirigido críticas ao terceiro mandato do petista, sinalizando uma suposta "usurpação" de poderes do Legislativo. Outrora fiador de uma série de planos do governo, o presidente do Senado pediu que o governo apresentasse medidas alternativas à alta do IOF para compensar déficits nas contas públicas. Relatou ainda, segundo aliados, que a insatisfação com o decreto era maior entre os senadores do que a observada na Câmara. Lula e Alcolumbre se aproximaram no início do ano, após senador conquistar o comando do Congresso Ricardo Stuckert/Presidência da República O senador repetiu que não houve diálogo por parte do Planalto para a tomada de decisão e que isso poderia levar o Congresso a também tomar uma medida unilateral. A tônica das declarações, na avaliação de senadores, é um raro episódio de descompasso entre Davi Alcolumbre e Lula. Acordos e lua de mel Conhecido por ser cumpridor de acordos e pela habilidade de negociação, Alcolumbre vem ganhando espaço e prestígio no terceiro mandato de Lula. Desde a posse do petista, o senador tem evitado críticas públicas à gestão e privilegiado a abertura de caminhos para negociatas que rendam frutos para os dois lados. O bom trânsito de Alcolumbre com diversos setores da política o transformou também em uma espécie de articulador informal do Planalto, com o qual Lula tem mantido conexão direta, sem intermediários. Provas da boa relação estão espalhadas por indicações de Davi Alcolumbre em várias instâncias da administração pública. Na ponta mais visível, o presidente do Senado é o responsável pela nomeação de dois ministros da Esplanada de Lula (Comunicações e Desenvolvimento Regional). Em "lua de mel" com Lula, Alcolumbre pegou carona em seguidas viagens internacionais do petista — as mais recentes à China e à Rússia. Enquanto ele cumpria agendas com Lula, o Senado ficou paralisado. Davi Alcolumbre conquistou ainda o compromisso de Lula em dar andamento aos estudos para exploração de petróleo em águas profundas do Amapá, na chamada Margem Equatorial. Ana Flor: reunião com Motta e Alcolumbre teve ‘boa vontade’, diz Haddad As contrapartidas foram várias. Quando presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Alcolumbre fez andar pautas e indicações de interesse do Planalto. Como chefe do Senado, além de destravar propostas do governo, ele também tem se colocado como mediador de polêmicas. Um dos exemplos é a entrada de Alcolumbre nas discussões sobre uma proposta de anistia aos condenados pelos atos do 8 de janeiro. No caso da alta do IOF, senadores avaliam que o recado é diferente. Parlamentares afirmam que Alcolumbre e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), deixaram claro que, caso não sejam apresentadas sugestões pela Fazenda, o Planalto sofrerá uma derrota. O alerta se assemelha ao tom da conversa entre o presidente do Senado e a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, sobre o avanço de uma CPI mista para investigar fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Segundo relatos, o senador disse que não seria capaz de conter a comissão de inquérito e que pouco poderia fazer diante da vontade dos parlamentares. Leia também: Alcolumbre dá recado ao governo: 'Que decisão do IOF seja a última que tenta usurpar atribuição do Legislativo' Blog da Ana Flor: Reunião teve 'boa vontade' e abriu espaço para medidas estruturais, diz Haddad após encontro com Motta e Alcolumbre Outros rachas na relação Eleito com apoio de parlamentares de direita à esquerda, o presidente do Senado tem tentado se equilibrar entre os compromissos firmados junto aos dois lados. Horas antes do encontro com Haddad, Alcolumbre impôs ao Planalto uma derrota. Ele colocou em votação no plenário uma proposta que derruba dois decretos de Lula para demarcação de terras indígenas em Santa Catarina. Quando era presidente da CCJ, Alcolumbre havia defendido a anulação das normas. À época, ele disse ter se sentido "enganado" pelo governo Lula. O senador ainda sinalizou que, ao editar os decretos de SC, o Planalto havia descumprido acordo para paralisar demarcações enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) não concluísse julgamento sobre o marco temporal. Nos bastidores, o presidente do Senado também conta com outras rusgas relacionadas a membros do governo. Um dos alvos, segundo aliados, é o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Alcolumbre também diverge de indicações feitas pelo governo Lula. Sob a gestão do amapaense, sabatinas de diversos cargos em agências reguladoras estão travadas. Desde que assumiu o comando da Casa, o senador tem sido emissário de pedidos de mudanças dos nomes enviados por Lula para aprovação. São 17 indicações que aguardam a aprovação do Senado desde o ano passado. Na lista, estão cargos na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e na Agência Nacional do Petróleo (ANP).